COVID-19: Locadores e locatários travam disputas no Judiciário para equacionar os aluguéis
Por Priscilla Chater
sexta-feira, 15 de maio de 2020
Sem precedentes, a atual crise tem exigido parcimônia das partes nas renegociações dos contratos de locação, especialmente quanto à redução temporária do valor do aluguel, mas quando não há consenso, as desavenças têm sido submetidas ao crivo do Judiciário.
Se, de um lado, os locadores se recusam a reduzir os aluguéis a patamares módicos, do outro, os locatários, sobretudo, de imóveis comerciais, buscam meios de manter seus negócios após substancial queda do faturamento.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios tem se posicionado no sentido de, em determinados casos, reduzir à metade os aluguéis comerciais, sem prejuízo de uma reavaliação periódica, conforme o desdobramento das medidas restritivas oriundas da pandemia e a retomada das atividades empresariais.
Esse foi o entendimento adotado pelo Juízo da 24ª Vara Cível de Brasília, na ação revisional[1] proposta por um tradicional restaurante italiano, que, em sua decisão, expôs: “…oportuna e adequada, em tal cenário, a intervenção jurisdicional a fim de reequilibrar, na medida do possível, os interesses que, em dada medida, estariam contrapostos. Com efeito, não se pode atribuir culpa, ou mesmo risco do negócio, a qualquer das partes, considerada a excepcionalidade de uma pandemia.”.
Em sentido contrário, a Justiça de Santa Catarina, em decisão prolatada no início de abril, indeferiu o pedido liminar de redução do aluguel de uma sala comercial, destacando que o pedido de revisão não pode ser analisado apenas sob a ótica de uma das partes, mas sim de ambas[2].
Isso porque, a interpretação do art. 317, que trata sobre a desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o momento de sua execução, não pode ser desvencilhada da disposição contida no art. 478, ambos do Código Civil, segundo a qual a desproporcionalidade das obrigações contratuais se verifica quando, concomitantemente, a (i) prestação se tornar excessivamente onerosa para uma das partes (ii) com extrema vantagem para a outra.
Além do mais, há de se atentar para o fato de que não há qualquer posicionamento firmado a respeito do diferimento ou parcelamento do desconto eventualmente concedido pelo locador ou mesmo fixado judicialmente, de modo que tais questões ainda serão objeto de análise. Vale, ainda, reforçar que as decisões de caráter liminar são precárias e podem ser alteradas quando da prolação da sentença.
Desse modo, certo é que o melhor caminho é seguramente a autocomposição, uma vez que a judicialização, somada à instabilidade ora vivenciada, gera um desgaste emocional e financeiro aos envolvidos, afora toda a incerteza que circunda a interpretação e os critérios que serão estabelecidos pelas instâncias superiores quando da uniformização de entendimentos.
“Mas enfim o passado é sem remédio; Curva-nos o destino. Amaino a fúria, Justo não é perpetuar as iras.”.[3]
[1] TJDFT. Processo eletrônico: 0713297-63.2020.8.07.0001/DF; 24ª Quarta Vara Cível de Brasília/DF; DJE: 11.05.2020;
[2] TJSC. Processo eletrônico: 5001853-72.2020.8.24.0079/SC; 2ª Vara Cível de Videira/SC; decisão de 01.04.2020.
[3] HOMERO. Obra Ilíada. Tradução de Odorico Mendes. Disponível em https://iliadadeodorico.wordpress.com/xix/